Ricardo Galvão, cientista e ex-diretor do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e candidato a deputado federal (REDE-SP).
São cada vez mais visíveis e incontestáveis os efeitos das mudanças climáticas em face do progressivo aquecimento global. As consequências seguem sendo mais severas do que previsto nos já cada vez mais dramáticos relatórios divulgados pelo IPCC (o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas).
Portanto, trilhar o caminho das energias limpas e renováveis é proporcional aos objetivos de manter a sobrevivência humana no planeta, por mais que tenhamos inúmeros obstáculos a ultrapassar.
Questões pontuais como a guerra da Ucrânia desequilibram a geopolítica internacional adiando esforços conjuntos rumo à transição energética da Europa, por exemplo, que diante dos novos desafios tem apostado no carvão e no petróleo como solução imediatista para fazer frente às suas necessidades sem contar com o gás natural russo, que, bem ou mal emite menos gases de efeito estufa que outras fontes fósseis.
Mas a questão de fundo e que impede esforços conjuntos é a que coloca os países competindo entre si e deixando de fazer investimentos necessários para reduzir satisfatoriamente suas emissões. Fato é que ano após ano as Conferências Climáticas, as conhecidas COPs, promovidas pelas Nações Unidas clamam por maior entendimento quanto a urgência de ações para se alcançar uma economia verdadeiramente de baixo carbono.
Mesmo com todos esses problemas, o que tem feito a diferença é um prolífico e constante avanço tecnológico que torna a eletricidade limpa produzida pelo sol e pelos ventos a cada dia mais barata. Hoje esse custo já é menor que a gerada pela energia fóssil.
Entre os anos de 2010 e 2020, o preço dos painéis solares, por exemplo, caiu 90% tornando cada vez mais acessível a que podemos considerar a energia mais democrática existente. Isso em razão de suas múltiplas possibilidades deuso seja num pequeno painel instalado numa luminária até uma mega usina capaz de abastecer uma cidade.
Outros fatores como a maior eficiência energética e avanços tecnológicos tornaram as energias limpas muito mais atrativas, com enorme potencial para gerar postos de trabalho aumentando ainda mais a sua aceitação na sociedade e sendo um fator importante de crescimento econômico. Não é por outra razão que mais e mais empresas têm participado de encontros em que se discute aquecimento global, afinal mudanças climáticas são um sério fator de risco para os negócios.
Portanto, já que os governos não têm sido capazes de agir de maneira eficiente nessa transição colocando políticas públicas à serviço do combate ao aquecimento global, outros atores têm feito esse trabalho e fatores puramente de lógica econômica são protagonistas desse cenário.
Agora há de se perguntar: isso será suficiente para reduzirmos as emissões globais que evitem o aumento constante da temperatura no planeta? Difícil responder, mas inicialmente a resposta é não.
O fundamental trabalho da iniciativa privada precisará estar alinhado com as necessidades de toda a sociedade, bem como, receber apoios de políticas públicas capazes de atender as demandas, desobstruir os gargalos e, fundamentalmente, contribuir para o desenvolvimento e crescimento econômico.
O potencial brasileiro
No Brasil o cenário não é diferente ao encontrado no resto do mundo, mas com algumas características puramente nacionais. A energia elétrica produzida no país já é uma das mais limpas do mundo. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) 74,55% da energia elétrica brasileira tem como origem fontes renováveis somando a isso a energia produzida pela queima do bagaço e resíduos de cana de açúcar esse número sobe para 79%.
As condições para que o Brasil atinja um lugar ainda mais privilegiado nesse cenário são, simplesmente, fantásticas, pois temos um enorme potencial para o aproveitamento da energia solar e dos ventos.
Quando se fala em energia eólica, a potência instalada cresceu de 932 MW, em 2010, para 16.979 MW, em 2020, o que já é maior do que a potência instalada da Usina de Itaipu, a segunda maior usina hidrelétrica do mundo. Segundo as previsões da Associação Brasileira de Energia Eólica, a ABEEólica. a potência instalada deve alcançar 28 GW até 2024. Só no ano passado, a energia dos ventos foi responsável por evitar a emissão de 34 milhões de toneladas de CO2 correspondente ao gás carbônico emitido por 34 milhões de carros movidos à gasolina ou diesel. A energia eólica possui 12,7% de participação na matriz elétrica brasileira e já alcançou o sexto lugar no Ranking Global de Capacidade Instalada onshore, segundo a Global Wind Energy Council (GWEC) e continua a se expandir.
Em relação a solar, como já disse antes o custo da energia fotovoltaica se reduziu de maneira formidável em dez anos. Hoje, ela custa menos do que a energia eólica, e as duas custam menos do que a eletricidade de fonte hidráulica, fóssil ou nuclear.
Mas o Brasil ainda é o 13º produtor de energia fotovoltaica mesmo tendo um dos maiores potenciais de geração solar no mundo. Na matriz energética ela representa em torno de 2% sendo o uso residencial o mais difundido responsável por 72,6% de todas as instalações existentes e atingiu 30 mil imóveis, depois seguem empresas de comércio e serviços com 17,99% e o setor rural com 6,25%. Apesar de ainda pequeno a potência instalada de 4.460MW representa um crescimento de 45% em relação a 2018.
Por fim e não menos importante, o Brasil foi pioneiro no mundo por desenvolver um consistente programa de biocombustíveis desde os anos 70 do século passado com o Próálcool. De lá pra cá, o projeto só se consolidou. Recentemente novas iniciativas buscam promover ainda mais o uso desses combustíveis ao buscar dar viabilidade econômica do etanol e biodiesel celulósico, também chamado de segunda geração, que são produzidos a partir de resíduos agroindustriais que se encontram em abundância em nosso país.
Políticas públicas e ação coordenada
Para avanço dessas energias limpas e renováveis é preciso que além de esforços privados, sejam estabelecidas políticas públicas que incentivem a pesquisa e o desenvolvimento; formar cientistas especializados e criar infraestrutura que dê condições de trabalho para esses profissionais.
O fortalecimento da pesquisa dará condições para abordar todos os aspectos da transição energética, principalmente, para projetar redes de transmissão e distribuição inteligentes de eletricidade, projetadas para dar estabilidade ao sistema de geração distribuída que comportem as inúmeras novas ligações propiciadas pelos painéis fotovoltaicos. Aumentar no país a produção local de equipamentos e insumos responsáveis por essa transição criando valor e gerando milhares de empregos e mão de obra especializada. E, por fim, garantir políticas de longo prazo para o setor energético capazes de dar previsibilidade e confiança aos investidores que estarão seguros e comprometidos com o crescimento do país.
Por essa razão as eleições que se aproximam serão fundamentais para a construção do país que queremos a partir do ano que vem. Um Brasil mais próspero, sustentável e admirado em todo o planeta.