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Foram necessários 68 anos de existência do instrumento de investigação que é a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), para que a sociedade pudesse “fiscalizar o fiscal”. A CPI proposta pelo deputado estadual Jailson Lima (PT) investigará o Ministério Público de Santa Catarina pela compra de um “prédio fantasma” sem licitação. O deputado tem quatro assinaturas além das 14 necessárias para instaurar a investigação. “Essa é uma luta e um feito histórico que pertencem à sociedade. Cabe a nós deputados sermos representantes da busca pela transparência na gestão do dinheiro público”, garantiu Jailson.

Como “estratégia”, o deputado tem buscado apoio de outras instituições, para depois instaurar a CPI. Em fevereiro, antes de submeter requerimento para abertura da comissão, ele esteve no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) com a finalidade de denunciar o ministério catarinense.  Jailson retornou a Brasília no dia 27 de março, munido de todos os documentos necessários para auxiliar o CNMP na investigação. Além daqueles que embasam a CPI, a ser instaurada na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), foram entregues as folhas de pagamento de procuradores e outra denúncia também envolvendo dispensa de licitação e outros milhões de reais.

Seguindo o plano, Jailson participou da reunião de diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no dia 20 de março, em Florianópolis. O presidente da Comissão de Moralidade Pública da OAB, Georg Richard Daux, recebeu os documentos. “Ninguém está imune a uma prestação de contas”, comentou ele, que acredita que “as instituições se fortalecem dessa forma”. Além da avaliação da Comissão, Jailson quer membros da OAB para acompanhar a CPI. O presidente da ordem no estado, Tullo Cavallazzi Filho, garantiu que a CPI será acompanhada de perto por um membro.

Ao Sindicato da Indústria e Construção Civil (Sinduscon), em Florianópolis, o deputado solicitou que a CPI seja acompanhada por um engenheiro. O presidente do sindicato, Hélio Bairros, analisará a indicação de um membro. “Vejo, através da imprensa, que seu trabalho não tem sido fácil”, afirmou Bairros, que completou: “Não compactuo de forma alguma com negócios que venham a prejudicar a imagem do setor”.

Colegas deputados estaduais da Alesc apoiam a iniciativa de Jailson. Edison Andrino (PMDB) acredita que a aquisição do prédio “merece ser apurada, não como um processo de represália, de perseguição, mas de esclarecimento de uma compra, na minha maneira de ver absurda”. Para o Sargento Amauri Soares (PSOL), Jailson cumpre seu dever: “Como um dos três poderes do Estado de Direito Democrático, é dever da Assembleia Legislativa fiscalizar todas instituições. Sempre me posicionei a favor de abertura de CPI dos mais diversos temas. E dessa vez não pode ser diferente”.

A deputada Angela Albino (PCdoB) declarou, referindo-se à CPI e ao MP, que não se deve “desacreditar” uma instituição tão “importante para a democracia brasileira”. “Não quero macular a imagem do ministério, mas preservá-la, garantindo transparência em suas ações e correções de desvios cometidos por seres humanos, não pela instituição”, respondeu Jailson.

CPI DO “PRÉDIO FANTASMA”   
Apesar de terem sido levantadas diversas suspeitas de irregularidade, a CPI que será instaurada Alesc envolverá somente a compra do terreno.  “Não quero investigar para desacreditar a instituição, mas porque acredito que precisamos de mais transparência na gestão do dinheiro público”, defendeu.

No dia 17 de dezembro de 2013, o MPSC divulgou a dispensa de licitação para a compra de um “prédio comercial com área total construída de 20.974,67 m²”, em que não consta a aquisição de um edifício na planta. “Não existe prédio”,foi uma das frases mais repetidas por Jailson na plenária. Há apenas um terreno na rua Bocaiúva, nº 1792, onde está edificada uma casa antiga — a “Casa Rosa”—, que deve ser restaurada pelo MP. A restauração não é objeto do mesmo contrato de compra do “prédio”, o qual custará R$ 123.419.930,00.

O MP já pagou, pelo terreno de 2.365 m² e pela “Casa Rosa”, R$ 30 milhões para a contratada Becker Construção Civil, dois dias depois de dispensar a licitação. Esse foi o primeiro pagamento do cronograma assumido em contrato. Para o deputado Jailson, são questionáveis os preços estipulados em avaliações dos engenheiros e corretores de imóveis escolhidos pelo ministério. Acrescenta-se à compra sem licitação, o fato de o terreno ter sido área de preservação permanente (APP), cortado por um córrego.

No registro do imóvel, antes da compra pelo MP, o terreno com a Casa Rosa valia R$10 milhões. Já no contrato entre ministério e a empresa, passou a valer R$ 38 milhões. No preço antigo e com a primeira parcela já quitada, o terreno já estaria pago. A obra, que caiu na CPI dos Alvarás, instaurada pela Câmara de Vereadores, foi embargada. “Há muitos mistérios envolvendo essa compra. Não quero desacreditar a instituição, mas os sujeitos que são passíveis de cometer falhas”, explicou Jailson.

AS IRREGULARIDADES
Em 2012, o MP-SC fez contrato com a OI Sociedade Anônima (S.A) para os serviços de instalação de comunicação em tecnologia MultiprotocolLabelSwichthing (MPLS), de rede e de equipamentos. Também foi dispensada a licitação. O compromisso de pagamento compromete a quantia de R$ 41.250.201,91, parcelada em seis anos, entre 2012 e 2017. Jailson argumentou que o contrato deveria ter sido feito “em blocos”, dividido entre várias empresas e criticou o fato de a Oi não ser a única fornecedora dos serviços requisitados, o que torna a dispensa de licitação “injustificável”.

Em 2013, o MP-SC resolve comprar um terreno localizado na rua Bocaiúva, em Florianópolis (SC), para construção de sua sede. Antes da transação de compra entre a Becker e o ministério, o terreno custava R$ 10 milhões no registro de imóveis. Passou para R$ 38 milhões no acordo entre as duas partes. No contrato, o MP compra um prédio por R$ 123 milhões, onde só existe um terreno e a “Casa Rosa”, e paga R$ 30 milhões de entrada. Diante dos fatos, Jailson suspeitou: “O Ministério Público está financiando a obra”.

Os salários de procuradores do MP-SC também estão na mira de investigação. O rendimento anual deles pode chegar a R$ 1 milhão. São 23 tipos de indenizações, de acordo com Jailson, que os procuradores podem receber. Entre elas, gratificações natalinas podem passar de R$ 20 mil. Com tudo isso, salários ultrapassam o teto constitucional. “Tem procurador ganhando mais que a presidente só de penduricalhos”, ironizou ele.

Nas seis caixas que o deputado levou a Brasília estão os seguintes documentos: ação de danos ambientais do terreno da rua Bocaiúva, ação sobre aquisição do imóvel pelo MP-SC, a nova denúncia do contrato de telecomunicações, o demonstrativo de salários e as folhas de pagamentos mensais (esses dois últimos pertencentes a procuradores e promotores, pesquisados de outubro de 2012 a dezembro de 2013).

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