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Por Raquel Carlos, diretora do Edify Education, e Andreia Fernandes, coordenadora acadêmica do Edify Education

Mal passados dois anos de extensa exposição ao medo e ao isolamento social trazidos pela pandemia, as escolas ainda vivem sob os efeitos da insegurança, dessa vez diretamente relacionada à violência. Alunos, professores, gestores e funcionários estão mais uma vez à procura de caminhos para superação da vulnerabilidade emocional à qual estão todos submetidos. O enigma relacionado às narrativas de medo que têm ocorrido na esfera escolar possui diferentes vetores, ainda não amplamente compreendidos, porém um ponto merece reflexão: o desenvolvimento socioemocional.

No passado, diante do enfrentamento de perigos reais e físicos, o medo nos ajudou no processo de proteção a predadores e inimigos. Embora o mundo tenha mudado muito, nosso cérebro ainda não percebeu essa transformação de forma clara e situações que possam causar reações negativas, sejam elas intensas ou não, contribuem para a sensação de medo.

A escola, em sua essência, é um espaço de construção do conhecimento, do contato com diferentes culturas e práticas pedagógicas, da compreensão das vivências sociais, da experiência ética, estética, técnica e do lazer. No entanto, o cenário atual traz discussões sobre a arquitetura socioemocional das escolas e põe a saúde mental em estado de fragilidade. Diante do medo extremo das barbáries, a comunidade escolar luta para entender a origem de tais conflitos para conseguir reconstruir com urgência sua resiliência psicológica. Um ponto de partida é a compreensão do comportamento de seus atores mais pungentes: os estudantes.

Celulares de última geração, jogos em rede com intensa demanda cognitiva, tecnologia 4D são alguns dos recursos tecnológicos que estão amplamente à disposição dos nascidos entre os anos 2000 e 2010. A digitalização das emoções e a banalização do afeto fazem parte da vida de uma geração que busca por ajuda, sem, muitas vezes, estar ciente. A questão não está no uso da tecnologia em si, mas no tipo de vida virtual que pré-adolescentes e adolescentes estão vivendo na fase mais complexa de suas vidas. Muitos jovens, através das redes sociais, dark web e fóruns de jogos têm acesso direto a conteúdos com os quais não estão preparados para lidar, visto que ainda não conseguem compreender os próprios conflitos. Ainda há carência de suporte, apoio e escuta.

Nesse sentido, surgem muitos questionamentos sobre qual deve ser o papel da escola, que não pode — nem deve — atuar isoladamente, sendo necessário um trabalho paralelo com as famílias e a sociedade. O alerta é para todos, pois as consequências são vivenciadas pelo coletivo. A busca por informação e orientação é um caminho que vem sendo trilhado. Porém, precisamos estar vigilantes às fragilidades emocionais dos jovens que estão conectados com o mundo num toque de tela e ao mesmo tempo isolados em seus nichos, seus quartos, seu próprio mundo virtual. Muitos passam a contar com as orientações de anônimos virtuais, que não medem esforços para atrair seguidores, cuja fonte de inspiração é a violência, como forma de expurgo de seus mais íntimos dilemas e questionamentos.

A comunicação entre a escola, as crianças e os jovens nos coloca frente a frente com narrativas diferentes, com muitas histórias de vida, com várias metáforas de visualizar e representar o mundo. Essas histórias pessoais compartilhadas nos ajudam a iluminar nossa trajetória, dificuldades e sonhos. O grande desafio neste momento é como ajudar a comunidade escolar a reorganizar e reestruturar suas experiências emocionais. O clima de acolhimento, confiança, incentivo e colaboração são decisivos.

A criação de rodas de convivência pode ser uma boa opção para descrever problemas, identificar emoções e criar debates sobre o que pode ser feito, abrindo um espaço para uma escuta acolhedora, sem julgamentos, comparações, competição. Isso representa cuidado, proteção e empatia, elementos fundamentais para uma educação socioemocional eficaz.

O lúdico, por sua vez, pode ser um grande aliado para o desenvolvimento das emoções. Somos lúdicos em nossa essência, aprendemos brincando desde criança, mas, ao longo da vida, vamos abandonando esse lado que representa o alavancar da criatividade humana. A criação de espaços de expressão é alternativa para experimentar, criar, transformar e usar a imaginação de diferentes formas, contribuindo para o autoconhecimento e o acolhimento das emoções.

Com tudo isso, faz-se necessária a leitura dos sinais não verbais, dos comportamentos, dos silêncios carregados de significados, que, muitas vezes, não conseguimos perceber. Mas podemos aprender a compreendê-los, mediante a abertura para o diálogo, a escuta, a compreensão e o contato com as histórias de cada pessoa, o que nos ensina a ser e conviver. Precisamos estar dispostos a acolher nossas fragilidades para que repensemos o papel da educação emocional como pilar de uma saúde mental de qualidade em tempos de inquietude e desorientação.

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