Liza Prado é deputada estadual pelo PSB
Nas últimas décadas, no Brasil, as mulheres têm alcançado muitas vitórias em sua luta pela cidadania plena e pela igualdade de direitos. A eleição de Dilma Rousseff, primeira mulher a presidir o País, é prova do crescente empoderamento do gênero feminino em nossa sociedade. Contudo, muitas brasileiras, de todas as classes sociais, idades e etnias, ainda enfrentam grande sofrimento em seu cotidiano, consequência da violência e da discriminação.
Segundo a Secretaria Nacional de Enfrentamento da Violência contra a Mulher, a cada 10 minutos, uma mulher é agredida no País. Paradoxalmente, menos de 10% dos Municípios possuem serviço de atendimento especializado. Os dados sobre violência de gênero tendem a ser subestimados, pois muitas vítimas não delatam ou admitem a agressão por medo ou vergonha ou por não interpretarem os abusos como violência, mas como uma parte da vida em família.
Para melhor compreender esse problema complexo e apresentar sugestões para combatê-lo, a Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais instalou, em 28 de março de 2012, a Comissão Especial da Violência Contra a Mulher. As Comissões Especiais são instrumentos de que o Poder Legislativo se utiliza para exercer a função fiscalizadora a ele atribuída pela Constituição e destinam-se à discussão e ao estudo de temas específicos de interesse social.
A Comissão iniciou seus trabalhos em abril de 2012. Até seu encerramento, em agosto do mesmo ano, foram realizadas 16 reuniões. Concretizando a missão do Parlamento estadual de promover a participação da sociedade na elaboração de leis e de políticas públicas, a Comissão contou com a colaboração de mais de quarenta autoridades e entidades públicas e privadas, entre as quais se incluem órgãos do Poderes Executivo e Judiciário estadual e organizações não governamentais. A interlocução com a sociedade civil permitiu a coleta de informações de enorme relevância, sintetizadas em um relatório final.
Os trabalhos foram orientados por estudos de Joan Scott, Cecília Sardenberg, Teresa de Lauretis e Jane Flax. Partiu-se do pressuposto de que a violência de gênero está inserta em um contexto de dominação, machismo e patriarcalismo. O Estado, por meio de leis e políticas governamentais, costuma reiterar essa estrutura de dominação, por condutas omissivas, ao se abster de interferir na vida privada dos cidadãos, tolerando agressões e outras manifestações de violência doméstica, ou por condutas comissivas, ao produzir um aparato institucional de índole masculina.
Evidência desse sistema de dominação institucionalizado é a baixa participação das mulheres nas esferas de poder. Em um ranking elaborado em 2010 pela União Interparlamentar, avaliando a participação política por gênero em 146 países, o Brasil ocupava o 110º lugar, a despeito da vigência da Lei nº 9.100, de 1995, que reserva às mulheres 30% das inscrições nas eleições para o Poder Legislativo, nas esferas municipal, federal e estadual. Em 2012, as mulheres totalizavam apenas 8,7% dos membros da Câmara dos Deputados. Na Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, composta por 77 Parlamentares, há somente cinco Deputadas, que perfazem 6,5% do total.
Apesar da dificuldade em romper com essa visão de mundo sexista, o País tem alcançado mudanças culturais significativas, impulsionadas por inovações legais e judiciais. Marcos importantes são a Constituição Federal de 1988, que consagrou a igualdade formal entre homens e mulheres e introduziu o dever do Estado de criar meios para combater a violência no ambiente familiar, e a Lei Federal nº 11.340, de 2006, a Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher e institui medidas de proteção e assistência às vítimas, considerada pela ONU uma das três melhores leis do mundo a disciplinar a matéria.
É louvável o esforço da Comissão Especial para averiguar a adequação das estruturas estatais para lidar com violência contra a mulher, por meio de uma análise da legislação vigente, dos procedimentos adotados pelos vários órgãos públicos, da atuação dos atores sociais envolvidos e das políticas públicas adotadas. O estímulo ao debate e à busca de informações é fundamental para que alcancemos a almejada igualdade de gênero, com a adoção de atitudes e práticas pautadas no respeito e na fraternidade.