Cerca de 200 pessoas, entre lideranças políticas, profissionais das áreas de saúde, assistência social, educação e representantes de órgãos públicos, reuniram-se entre a manhã e a tarde desta sexta-feira (19), na Faculdade Regional de Blumenau (Furb), para o 3º Encontro Estadual dos Conselhos Municipais dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Santa Catarina.
O evento foi promovido pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social, atendendo a uma solicitação do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conede-SC), em parceria com o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Blumenau (Comped) e com o apoio da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Assembleia Legislativa.
O objetivo do encontro, conforme o presidente do Conede-SC, Jairton Fabeni Domingos, é fortalecer a atuação dos 75 conselhos municipais atuantes em Santa Catarina e coordenar suas ações com base na legislação que rege o segmento.
Entre as atividades previstas constavam palestras sobre a importância social dos conselhos e sobre a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) e uma mesa temática sobre as políticas públicas voltas à pessoa com deficiência. “Esse encontro foi para fortalecer os nossos conselhos municipais e para orientar os seus representantes para que divulguem a Lei Brasileira de Inclusão e também a coloquem em prática em seu dia a dia, pois é bastante completa.”, disse Domingos.
O deputado Dr. Vicente Caropreso (PSDB), que preside a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência, também destacou a importância do evento. “Este é um espaço democrático para que cada um dos conselhos municipais possam trocar ideias, avaliar ações, seguir exemplos bem sucedidos e para reforçar a política de direitos humanos que protege as pessoas com deficiência espalhadas pelo estado de Santa Catarina.”
O prefeito de Blumenau, Mário Hildebrandt, que já atuou como secretário municipal de desenvolvimento social entre 2005 e 2012, afirmou, por sua vez, que ainda que possua bons índices econômicos, Santa Catarina ainda é muito carente em ações para o amparo da população mais necessitada. “Nós temos sim problemas nesse sentido e a política de desenvolvimento social precisa ser consolidada, estar presente através dos Cras [Centros de Referência de Assistência Social] e dos Creas [Centro de Referência Especializado de Assistência Social], do apoio a essa política pública através das ações de abrigamento, ou seja, precisa estar se motivando e participando de todos os processos.”
Espaço para discussão
Instituídos oficialmente pela Constituição Federal de 1988, os conselhos municipais dos direitos da pessoa com deficiência são instâncias de caráter consultivo, deliberativo e fiscalizador, voltadas à promoção de políticas públicas a este estrato a população. Entre elas, ações que assegurem assistência, prevenção e atendimento especializado, bem como campanhas contra a discriminação.
A sua criação pode se dar tanto por manifestação da sociedade civil quanto do poder público, sendo constituído de forma paritária, por representantes das duas partes.
Presente ao encontro, a secretária de Estado de Desenvolvimento Social, Maria Elisa de Caro, que também já atuou como conselheira municipal, afirmou que estas instâncias servem para aproximar e fazer a interlocução entre o poder público e os cidadãos.
É por meio deles, disse, que as legislações e ações implementadas pelos governos ganham mais eficácia, pois são construídas levando em consideração as reais necessidades da população. “Não existe um ambiente mais propício para a gente acertar a construção da política pública porque ele é muito consciente. A gente costuma dizer que as leis podem até ser legais se passarem pelo trâmite que deveriam passar, mas não necessariamente são legítimas, porque podem ter sido construídas sem a vontade da sociedade.”
Manutenção do Conade
Uma das principais preocupações entre os participantes do encontro girou em torno da manutenção do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade).
Implantado há cerca de duas décadas e possuindo atualmente 36 membros, o futuro do Conade segue em clima de insegurança diante da decisão presidencial de extinguir diversos conselhos de administração pública. Um decreto do Executivo Federal chegou a ser emitido neste sentido, mas foi tornado sem efeito no início do mês passado por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
“Hoje o Conade está muito vulnerável, pois foi criado por decreto, então estamos incessantemente discutindo e buscando apoio para recriar o órgão por meio de projeto de lei”, disse Daiane Mantoanelli, assistente social da prefeitura de Blumenau e membro do Conade.
Ainda de acordo com ela, uma possível extinção do órgão traria reflexos negativos aos projetos implementados em todas as esferas públicas. “Todas essas políticas públicas são fomentadas, debatidas e amplamente construídas por esse conselho, cuja extinção terá o efeito de um rolo compressor. Os municípios e estados também poderão ter retrocessos na participação social das pessoas com deficiência e consequentemente as políticas públicas para o setor.”
Regulamentação da LBI
Outro foco do encontro foram as discussões em torno da Lei Brasileira de Inclusão (LBI), também conhecida como Estatuto a Pessoa com Deficiência. instituída por meio da lei 13.146 de 6 de julho de 2015, a LBI buscou adequar o ordenamento jurídico brasileiro às disposições contidas na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de 2007.
Conforme a advogada, assistente social e conselheira do Conede, Kelly Cristiny Cabral, que proferiu palestra sobre o tema, a LBI trouxe diversos avanços, como unificar em um único texto as diversas legislações relacionadas aos direitos da pessoa com deficiência.
Outro ponto importante, disse, foi estabelecer punições aos gestores públicos em caso de descumprimento do disposto. “As pessoas com deficiência perfazem 24% da população brasileira e é preciso ter um olhar diferenciado para elas e de maneira integral para que consigam ter um mínimo de dignidade, que é o direito de poder sair de casa e chegar ao lugar que se precisa. Então a improbidade administrativa é um grande passo para que se possa ter a efetividade da lei, para que se possa viver num mundo sem barreiras e que todos possam ter respeitados os seus direitos.”
Já o advogado Luís Claudio da Silva Rodrigues Freitas, que é membro da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB-RJ, falou sobre a necessidade de regulamentação do artigo 2º da LBI, que define o que se considera oficialmente como pessoa com deficiência.
O dispositivo é mais uma inovação trazida pela LBI, disse, pois muda o foco do modelo biomédico, que restringia a condição de deficiência a fatores biológicos como vírus, genes ou anormalidades somáticas, para o biopsicossocial, que estuda a causa e o progresso da doença usando fatores biológicos (genéticos, bioquímicos), psicológicos (estado de humor, de personalidade, de comportamento) e sociais (culturais, familiares, socioeconômicos, médicos).
De acordo com Freitas, a expectativa do segmento é que este instrumento de avaliação fosse regulamentado em janeiro de 2018, mas a ação ainda segue sem data definida. “É importante que essa conclusão aconteça e que haja uma participação, que se ouça a sociedade civil e que se faça essa regulamentação o mais rápido possível para que a pessoa que vá buscar o seu direito a um transporte, a uma gratuidade, a um concurso público, seja avaliada já nessa nova lógica trazida pela Lei Brasileira de Inclusão”, disse na ocasião.