Por: Carlos Thadeu

Poder 360

O crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) trimestral apontado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) provou que podemos acreditar e elogiar a recuperação econômica em forma de V. O resultado acima das expectativas tem relação, vale notar, com o processo de adaptação dos consumidores e empresas à nova realidade da pandemia.

O balanço de riscos para a inflação, no entanto, ainda segue pressionado por incertezas sobre a evolução dos preços, com desequilíbrios na oferta e na demanda. Essa desorganização se soma aos preços altos das commodities e do dólar, que apesar de estar caindo, ainda não é o suficiente para desacelerar a inflação este ano, que deve ser ao redor de 6%. Esse contexto deve repercutir nos preços de varejo e pode impor novos desafios à frente.

A recuperação em V voltou, mas ela vai depender muito da evolução dos gastos do governo e do tapering (desaceleração na compra de ativos para refrear o relaxamento monetário) que está ocorrendo nos EUA, e que pode elevar os juros norte-americanos, e apreciar ainda mais o dólar.

O PIB cresceu 1,2% no 1º trimestre comparativamente ao 4º trimestre de 2020, e 1,0% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, voltando ao terreno positivo nesta base comparativa, após 4 trimestres de quedas. Essa retomada foi possível graças ao bom desempenho da agropecuária pela ótica da oferta e dos investimentos pelo lado da demanda.

Os investimentos cresceram 4,6% na passagem trimestral, em que o nível da FBCF (Formação Bruta de Capital Físico) se recuperou da crise e retornou a patamar próximo ao do último trimestre de 2014. A retomada da FBCF mais rápida do que em crises anteriores está relacionada com a maior participação do setor privado na economia. A maior taxa de poupança, que alcançou 20,6% no 1º trimestre, ou 7,6 pontos acima do mesmo trimestre de 2019, além da alta liquidez e do crédito mais farto, têm possibilitado a evolução positiva do consumo e dos investimentos.

A retomada atual da economia brasileira tem se destacado quando comparada a outros episódios, desde 1980, em que o nível de atividade corrente já está mais elevado que o observado antes da pandemia, no 1º trimestre de 2020. E isso mesmo com o fim dos programas emergenciais, desde janeiro de 2021, e do recrudescimento da pandemia no começo deste ano.

O governo mirou no que viu e acertou no que não viu ao desconfiar do fiscal cliff (colapso econômico, redução dos gastos, queda do PIB e recessão), e a retirada dos estímulos temporários parece não ter impactado expressivamente na atividade no 1º trimestre.

As apostas para sustentar o crescimento vêm de um novo e duradouro ciclo de commodities, em resposta ao crescimento mais rápido da economia asiática, especialmente a China, além dos Estados Unidos. O ambiente global deve favorecer o desempenho da economia doméstica, já que o Brasil é exportador de commodities, e temos observado recuperação do volume de comércio exterior, além de elevados saldos comerciais.

As condições financeiras ainda frouxas, com a taxa de juros baixa, são outros estímulos ao crescimento no 2º semestre. Ainda que o BC (Banco Central) esteja subindo a Selic no sentido do maior equilíbrio com os juros neutros, a taxa real vai permanecer baixa em comparação ao nível pré pandemia.

As estimativas revisadas indicam que o PIB pode crescer próximo a 5% este ano, com um efeito carregamento de 4,8% para o próximo ano, sem considerar, entretanto, que 2022 é ano eleitoral e, consequentemente, cheio de riscos adicionais. Mesmo assim, se o governo conseguir segurar os gastos dentro da meta, com exceção das despesas com a pandemia, já estão contratados bons resultados econômicos para o próximo ano.

Mas as incertezas sobre a pandemia e uma 3ª onda, o ritmo lento da imunização da população geral, além de uma eventual crise hídrica e no setor elétrico são os fatores que hoje ofereceriam restrições ao crescimento continuado da economia nos trimestres à frente.

Além disso, as pressões inflacionárias que têm levado aos aumentos de juros, encarecem o custo do capital às empresas e do crédito às famílias. Em um contexto de endividamento elevado, podemos ter acirramento da inadimplência e limitação à recuperação econômica. A principal ameaça doméstica está na inflação e na persistência do desemprego, que podem diminuir o impacto do crescimento, afetando as famílias nas faixas de menor renda, em especial.

Embora tenhamos inflação corrente mais elevada, o bom andamento da política fiscal melhora o balanço de riscos para as perspectivas inflacionárias e essa é a visão atual do Banco Central: após muita confusão para aprovar o Orçamento deste ano, a agenda de reformas e a melhora fiscal têm efeito positivo no balanço de riscos para a inflação e, como consequência, na condução da política monetária.

O balanço de riscos é resultado de avaliações e julgamentos subjetivos do Copom (Comitê de Política Monetária), o qual habitualmente olha o comportamento dos prêmios de risco e a evolução da dívida bruta do governo. E recentemente, ambos indicadores tiveram alguma melhora.

Em suma, a inflação aumentou, mas a política monetária continua estimulativa, permitindo crescimento do comércio. O endividamento cresceu, mas a inadimplência está sob controle. Depois de muito tempo, os investimentos vêm ganhando destaque no crescimento do PIB trimestral, favorecendo o crescimento da renda de longo prazo no país. Devemos reconhecer que temos desafios relevantes à frente, mas também reverenciar o bom desempenho econômico em meio ao pior momento enfrentado pelo Brasil nessa crise sanitária.

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