Deco Bancillon
A estratégia do governo de incentivar o crédito num momento em que o consumo das famílias já começa a dar sinais claros de esgotamento pode não surtir o efeito esperado. Isso porque, após anos de políticas voltadas à compra de bens via desoneração de tributos como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a aquisição de veículos, móveis e eletrodomésticos, o espaço no orçamento doméstico para assumir novos débitos encolheu. Até junho, segundo dados do Banco Central (BC), as dívidas/brasileiros apenas com instituições financeiras chegaram ao patamar recorde de R$ 1,324 trilhão.
Nunca antes na história do país os consumidores deveram tanto para os bancos, e o pior: além de já ter comprometido boa parte da renda com parcelas de financiamentos, o brasileiro está pagando mais caro para quitar esses empréstimos. Em junho, a taxa média de juros cobrada dos consumidores chegou a 43% ao ano, o maior patamar desde março de 2011, quando o BC começou a fazer esse levantamento.
Ainda mais grave do que o número, observa o economista-chefe da Boa Vista Serviços, Flávio Calife, é a rapidez com que os juros avançam. “As taxas têm subido muito, motivadas pela crescente desconfiança dos banqueiros com o futuro, e, em especial, pela evolução do mercado de trabalho. Então, se ele entende que pode ter problemas para reaver o dinheiro que empresta agora, vai cobrar um prêmio de risco maior, e isso se reflete nos juros pagos pelos consumidores”, disse.
É justamente o que tem ocorrido. Em abril de 2013, a taxa média cobrada das famílias chegava a 34,4% ao ano. De lá para cá, aumentou 8,6 pontos percentuais, acompanhando a escalada da desconfiança de investidores e empresários na economia, e o ciclo de aperto nos juros comandado pelo BC no último ano. Mesmo assim, as taxas subiram pelo menos duas vezes mais que a Selic no período.
Há situações, no entanto, nas quais o aumento observado supera 10 vezes a alta da Selic. Quem, por exemplo, recorreu ao cheque especial recentemente se assustou com o extrato bancário. Apenas em junho, os juros médios praticados nessa linha chegaram a 171,5% ao ano. Contra maio, houve alta de 3 pontos percentuais, mas, contra abril de 2013, exatamente quando o BC deu início à escalada dos juros, a elevação chega a 34,7 pontos percentuais. Apenas como comparação, a Selic subiu 3,75 pontos no período.
Apesar de apresentar uma taxa tão elevada, o cheque especial é uma das principais linhas de crédito utilizada pelo brasileiro. Nos últimos 12 meses, as dívidas contraídas nessa modalidade cresceram 7,1%, evolução que o chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel, classificou como “crescimento significativo”.
Fonte: Correio Brasiliense
Ilustração: Portal Feedback