A situação do sistema prisional do Rio Grande do Norte foi debatida em uma audiência pública nesta segunda-feira (6) na Assembleia Legislativa, proposta pelo deputado estadual Kelps Lima (Solidariedade). Entre problemas corriqueiramente apontados, como a superlotação dos presídios e a necessidade de valorização dos agentes penitenciários, após quase 5 horas de debate, parlamentares, secretários e representantes da Segurança discutiram ações concretas que devem ser tomadas pelo Poder Público para amenizar os problemas. Os deputados Hermano Morais (PMDB), Fernando Mineiro (PT) e Márcia Maia (PSDB) estiveram na discussão.
Na abertura da audiência, Kelps Lima lembrou a autoconvocação da Assembleia Legislativa, em janeiro, para ações no combate ao crime e criação de uma Comissão Especial de Segurança Pública, que deve acompanhar a destinação dos recursos e propor ações em conjunto com os poderes no combate ao crime.
“A Comissão é um importante instrumento para iniciar o processo de recuperação do sistema prisional, mas não precisa apenas ouvir o Governo e concordar. O Estado não tem controle do sistema, por isso devemos fazer um diagnóstico e elaborar políticas públicas para melhorar o sistema carcerário”, disse Kelps Lima. Em seu discurso, o parlamentar ainda disse que a proposta do Governo do RN em desativar a Penitenciária Estadual de Alcaçuz teve motivação política partidária.
A presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários (Sindasp), Vilma Batista, também presente no debate, reiterou a necessidade de valorização dos agentes.
“Faço o mesmo discurso há cerca de 15 anos. Falta gestão e a sociedade precisa cobrar dos setores públicos. A população carcerária cresceu, a gestão pública não consegue evitar a criminalização nas ruas e não estamos prontos para receber esse número de presos”.
De acordo com Vilma Batista, faltam agentes penitenciários, cadeados, estrutura e equipamentos para o trabalho no sistema prisional. Apesar das notícias sobre a construção de novas unidades prisionais, a sindicalista acredita que somente a cadeia de Ceará-Mirim sairá do papel, mas não solucionará o problema.
“Estão nos expondo à situação indigna de trabalho e arriscando a vida dos servidores”, disse Vilma Batista.
O representante da Defensoria Pública, Francisco de Paula Leite, defendeu o cumprimento da Lei de Execuções Penais e a necessidade de medidas que não sejam pontuais, para tratar da situação atual, mas que evitem futuras crises.
O deputado Hermano Morais (PMDB) e a deputada Márcia Maia (PSDB) falaram sobre a ressocialização. “Um dos grandes problemas do aumento da criminalização é a falta de ressocialização e a construção de unidades de Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) poderia contribuir com essa questão. O Governo deve se preocupar em prevenir e fazer com que não tenhamos um aumento tão grande da população carcerária”, destacou Márcia Maia.
A ressocialização também foi argumentada pelo juiz Fábio Ataíde Alves, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. “A APAC tem uma baixa taxa de reincidência, em torno de 15% e, além disso, não precisa de grandes investimentos para compra de armas, construção de muros altos ou para a realização de concurso público, pois a comunidade é a forma de controle mais eficaz”, disse o juiz.
Fábio Ataíde disse ainda que essa não é a solução, mas que não é preciso usar um sistema caro e isonômico para todos, uma vez que existe um modelo alternativo, de baixo custo e eficaz.
O número da população carcerária também foi pauta da audiência e o juiz da Vara de Execuções Penais, Henrique Baltazar, destacou que não existe um controle sobre essa quantidade. Para ele, o Estado não consegue solucionar o problema porque não sabe quantos presos existem.
O Juiz atribuiu ainda o aumento da criminalidade no Rio Grande do Norte à força das facções. “Temos três grandes facções que estão barbarizando e no momento em que o Estado entregou o controle dos presídios a elas, incentivou para o fortalecimento das mesmas”.
Henrique Baltazar sugeriu ainda algumas mudanças em relação à Penitenciária de Alcaçuz. Para ele, o Pavilhão 5 deve ser transformado em uma unidade de segurança, com pessoas capacitadas para trabalhar.
Além disso, ele sugere a derrubada dos demais pavilhões para construção de uma unidade para presos com problemas psiquiátricos, uma enfermaria penitenciária e uma unidade de Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC).
Ivênio Hermes, especialista em Segurança Pública, disse que o crime organizado está cada vez mais imponderado pela ausência do Estado. “Não adianta criar vagas e deixar o sistema prisional sem controle e está sim porque não se observou desde os pilares, os erros já cometidos em gestões anteriores”.
O prefeito de Ceará-Mirim, Marconi Barreto (PSDB), falou sobre a unidade prisional que está sendo construída na região e disse que se o local for destinado aos 600 presos, tiver apoio psicológico, psiquiátrico e advogados, ele garante 500 empregos aos presidiários.
Os secretários de Segurança do Estado, Caio César Bezerra, e de Justiça e Cidadania, Walber Virgolino, falaram sobre as ações do Governo diante da crise na Segurança.
“O problema que enfrentamos hoje é uma situação que decorre de pelo menos 10 anos sem investimento nas áreas de segurança pública e sistema prisional. Pelas soluções não terem siso apresentadas, estamos enfrentando hoje essa crise, mas as soluções estão sendo discutidas e enfrentadas nesta gestão”, disse Caio César.
Entre os problemas enfrentados, o secretário citou o tempo em que não há concurso para ingresso de novos policiais e agentes penitenciários. Caio César disse que a prioridade do Governo é a contratação de novos agentes. “Estamos avançando no concurso para novos agentes penitenciários. Não adianta termos unidades-modelo, sem um profissional treinado para tomar conta do local”.
Entre as iniciativas do Governo, Caio César citou ainda a obtenção de recursos para construção de três novas unidades prisionais e quatro delegacias da Polícia Civil do Rio Grande do Norte dentro de módulos habitáveis projetados para comportarem as equipes da Polícia e receberem a população.
Outra questão apresentada pelo secretário é a ação conjunta com a Secretaria de Justiça e Cidadania para atender aos familiares dos presos.
Walber Virgolino reforçou as ações e disse que é a favor das unidades de Associações de Proteção e Assistência aos Condenados, mas segundo ele, a construção trava no orçamento. Ele disse que nenhum outro secretário ressocializou mais que ele e citou exemplos pelo país.
Ricardo Balestreri, ex-secretário Nacional de Segurança Pública, frisou que a máquina pública do Rio Grande do Norte é travada, o que, para ele, dificulta o andamento das ações.
“Reconheço o esforço dos secretários de Segurança e de Justiça. São pessoas comprometidas com a resolução do sistema prisional, mas sozinhos e com boa vontade não dão conta de tudo”, disse Ricardo Balestreri. Ele defende a criação de programas de emprego e renda, a abertura de novas vagas no sistema prisional e o esvaziamento dos presídios.
Participaram ainda da audiência pública, o deputado Fernando Mineiro (PT), a deputada Larissa Rosado (PSB), o representante da OAB Bruno Saldanha, representantes da Sociedade Civil, dos Direitos Humanos, da Pastoral Carcerária, além dos familiares dos detentos que esclareceram dúvidas com o Governo.